Empresas precisam ter um “plano de ação consistente e eficaz” para lidar com situações de assédio, afirma especialista
Uma extensa reportagem publicada nesta sexta-feira, (4) pela revista piauí, com acusações de assédio feitas pela atriz Dani Calabresa contra Marcius Melhem, ex-chefe do departamento de humor da TV Globo, levantou um grande debate nas redes sociais sobre assédio dentro das organizações.
A matéria, assinada pelo jornalista João Batista Jr, afirma que a atriz sofreu assédio sexual por parte de Melhem tanto dentro do ambiente de trabalho como em uma confraternização da equipe do programa Zorra em um bar no Rio de Janeiro. Em uma das ocasiões, ele teria agarrado e tentado beijar Calabresa à força. Outras mulheres, que preferiram não se identificar, também relataram à revista situações de assédio sexual e moral.
O ex-diretor nega as acusações, e a Rede Globo afirmou, em nota, que “todo relato de assédio, moral ou sexual, é apurado criteriosamente assim que a empresa toma conhecimento”, e que “não tolera comportamentos abusivos em suas equipes e incentiva que qualquer abuso seja denunciado”. A discussão em torno do caso levanta a questão: o que as empresas podem fazer para evitar casos de assédio sexual e moral
Cenário marcado por silêncio
Um levantamento desenvolvido pelo LinkedIn em parceria com a consultoria de inovação social Think Eva, publicado em outubro, indica que 95% das mulheres sabem o que é assédio sexual no ambiente de trabalho, mas pouco mais de 51% falam com frequência sobre o tema. E, enquanto o problema é de larga escala, atingindo uma em cada duas mulheres, apenas 5% delas recorre ao RH das empresas para reportar um caso. O baixo índice de queixas, de acordo com a pesquisa, está associado ao senso de impunidade, ineficiência de políticas internas e ao medo, além do sentimento de culpa pelo assédio sofrido.
De acordo com psicóloga e consultora de RH Meiry Kamia, quando de trata de assédio, muitas pessoas desistem de entrar com ações por temerem perder o emprego ou ficarem “manchados” na área de atuação. “A necessidade de haver testemunhas que comprovem o assédio também dificulta o processo, pois os colegas de trabalho também temem perder o emprego”, explica a consultora.
Para Meiry, o melhor caminho rumo à repressão do assédio é sempre a prevenção. “O assédio se instala nas organizações quando a vítima não é ouvida e o diálogo é impossível. Prevenir significa criar políticas que facilitem o diálogo e a comunicação verdadeira, o que inclui a educação dos gestores ensinando-os a lidar com tais questões levando em conta a natureza humana”, afirma a psicóloga.
A especialista em compliance Livia Cuiabano, da empresa especializada em compliance e soluções para gestão de riscos ICTS Protiviti, afirma que o assédio é um dos temas “espinhosos” nas corporações. “Quando um caso de assédio aparece, seja moral ou sexual, o clima corporativo é abalado, a privacidade dos envolvidos fica vulnerável, as opiniões se dividem, há temor, insegurança e polêmica internas e, em caso de repercussão na mídia, abalo na imagem e reputação da empresa”, explica.
Livia também reforça a importância da prevenção do assédio, e diz que empresas precisam ter um “plano de ação consistente e eficaz” para lidar com estas situações. “A intolerância ao assédio deve ser um dos valores da organização e, o combate, um de seus princípios de conduta.” Abaixo, ela compartilha alguns pontos que considera essenciais para combater o assédio.
Como prevenir o assédio nas organizações
1. Estratégia para encarar o problema
O primeiro passo, de acordo com Livia Cuiabano, é elaborar a estratégia para combate do assédio, precisa ir além de conhecer possíveis implicações sob o viés trabalhista, criminal, civil e administrativo, e deve refletir a cultura ética organizacional da empresa, que deve ser seguida, antes de tudo, pela alta gestão. “Envolve atração e retenção de talentos, bom clima interno, diversidade e outros fatores que se conectam com planos de crescimento dos negócios. Conhecer o perfil dos colaboradores é igualmente decisivo para se estabelecer uma estratégia que leve a abordagem à compreensão de todos, transformando a forma de pensar e agir”, explica.
2. Definição de normas
O que é ou não aceitável na instituição? É fundamental que as regras sejam formalizadas por escrito. Empresa pode começar com a elaboração de um código de ética, que depois pode ser complementado por políticas e procedimentos específicos. “Os comportamentos e atitudes esperados devem ser listados, assim como os que não serão tolerados. A linguagem e os exemplos devem ser compatíveis com a realidade da organização”, diz Livia Cuiabano.
3. Treinamentos
Ações de prevenção ao assédio devem ser trabalhadas em toda a empresa, lembrando os colaboradores que o respeito é uma condição indispensável para a convivência no ambiente de trabalho. “Para tanto, devem ser organizados treinamentos periódicos orientando sobre as condutas reprováveis e as balizas éticas pré-estabelecidas. Eles devem se amparar, ainda, em ações de comunicação e endomarketing efetivas para a conscientização quanto à repulsa ao assédio, como mensagens institucionais, vídeos educativos, dinâmicas interativas, cartilhas, games etc”, recomenda Livia. De acordo com ela, é indispensável customizar o conteúdo para cada público-alvo.
4. Canal de denúncias
“É imprescindível que haja canais por meio dos quais os indivíduos possam submeter as ocorrências ou casos suspeitos, possibilitando a realização de um processo investigativo. Eles devem ser geridos de forma isenta, com profissionais capacitados para a escuta ativa dos relatos de assédio”, diz Livia. Todos os colaboradores precisam confiar que organização leva o assunto a sério, e para isso toda denúncia deve ser devidamente apurada, seguindo um procedimento formal e isento para a apuração dos fatos, com total sigilo.
5. Proteção às vítimas
Como se trata de assunto delicado, empresas precisam entender que o processo é muito difícil para vítimas. “Expor o caso é, muitas vezes, expor ofensas e constrangimentos que já atingiram a dignidade, personalidade e integridade psíquica e física”, diz Livia. Por isso, é preciso ter o cuidado máximo para acolher a demanda do colaborador, e a organização precisa estimular e proteger quem precisa ser ouvido. “Empresa deve proteger, oferecer discrição e a não represália aos denunciantes de boa-fé, de modo a proporcionar o clima de confiança necessário para que o reporte seja feito”, explica a especialista.
Para ela, esse plano de ação, quando implementado com engajamento da alta direção, é capaz de promover “uma mudança na cultura corporativa para um local onde todos sejam ouvidos, estejam comprometidos e desejem estar: onde o respeito não é luxo, mas sim, condição indispensável”.
Por Livia Cuiabano, especialista de compliance na ICTS Protiviti
Fonte: Administradores.com
https://administradores.com.br/noticias/como-evitar-assedio-sexual-globo-dani-calabresa-marcius-melhem
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