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Canais de acolhimento: o que são, porque funcionam e como implementar
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Canais de acolhimento: o que são, porque funcionam e como implementar

Data da publicação: 04/03/2024
Por Luara A. StollmeierLuara A. Stollmeier

Há 21 anos, o obelisco do Ibirapuera se fez cor de rosa: luzes projetavam sobre o monumento o cuidado com a saúde das mulheres. Parte de um movimento internacional nascido na década de 1990, o motivo era a necessidade de prevenir casos de câncer de mama em mulheres e reeducar sobre hábitos de autocuidado e autoexame. Desde então, ocorreu um aprimoramento na identificação precoce da doença, bem como diferentes campanhas para exames preventivos, todos os anos.  

No mesmo período, a agenda de preocupações sociais e de governança incluíram mudanças no ambiente corporativo: companhias passaram a considerar a ética como parte essencial da sua estratégia, o ESG virou pauta de encontros governamentais, novas formas de gestão passaram a entender o colaborador como parte essencial de uma estratégia humana de desenvolvimento econômico. 

Nesta edição, celebrando a chegada do Outubro Rosa, a pauta é o Canal de Acolhimento, uma ferramenta que compõe as políticas de cuidado no âmbito corporativo. Veremos a sua potencialidade para os negócios que o adotam, seus benefícios para os colaboradores e sua estrutura de implementação. 

Construindo espaços de confiança: o que é um canal de acolhimento?

Os Canais de Acolhimento são um tipo especializado de canal de comunicação. Eles surgiram como estratégia para tratar situações e conflitos delicados, que afetam grupos específicos dentro do quadro de funcionários de uma organização. Tendo um canal adequado para comunicar tais situações, o processo de resolução feito pela empresa torna-se mais eficaz.  

Assim, são estruturas cuidadosamente concebidas para lidar com questões de extrema sensibilidade no contexto organizacional e uma ampla gama de temas, que frequentemente envolvem a diversidade, discriminação, assédio e inclusão. Esses canais são um recurso inestimável, principalmente para grupos minoritários que, em muitos casos, enfrentam desafios únicos e complexos. 

A capacidade de lidar com questões delicadas e sensíveis é fundamental para promover um ambiente de trabalho inclusivo e equitativo. Por meio disso, um canal de acolhimento contribui para a construção de uma cultura organizacional inclusiva, demonstrando o compromisso da empresa em fornecer um ambiente de trabalho onde todos se sintam respeitados e valorizados, independentemente de sua origem ou identidade.

Similares aos Canais de Ética, eles desempenham papel fundamental na consolidação da visão de grupo e de cultura organizacional. No entanto, se destacam em cenários específicos, nos quais o foco recai sobre o desenvolvimento de estratégias de inclusão, no âmbito interno, e de gestão da reputação da empresa, no âmbito externo. 

O Canal de Acolhimento como suporte da transformação cultural 

A importância dos Canais de Acolhimento está em sua capacidade de criar sinergia dentro da organização. Grupos minoritários podem expressar preocupações ou relatar situações em um espaço seguro e confidencial, enquanto a gestão catalisa relatos como indicadores reais para coordenar ações de inclusão e de transformação cultural.  

Todos ganham: colaboradores recebem o amparo necessário em situações que precisam ser administradas e combatidas, a empresa desenvolve uma perspectiva mais segura sobre o desenvolvimento de suas estratégias de inclusão, e o clima organizacional é orientado positivamente perante condições adversas. Por isso dizemos que um canal de acolhimento proporciona um sentimento de solidariedade e sinergia, importante especialmente em organizações em fase de aprimorar, disseminar e engajar novos valores em sua cultura. 

Um mercado em mudança demanda novas ferramentas 

O mercado de trabalho brasileiro está mudando e tende a ficar mais inclusivo. Políticas de incentivo como o “Emprega + Mulheres” pretendem impulsionar as estatísticas, implementando condições para atração e retenção de perfis diversos. O perfil demográfico está a favor da mudança: nos últimos dez anos, enquanto a população brasileira em idade ativa cresceu 13,4%, a quantidade de mulheres em idade ativa aumentou 26,4%, sendo 24,5% mulheres negras. 

População em idade ativa - mulheres
Fonte: https://ibre.fgv.br/blog-da-conjuntura-economica/artigos/crescimento-da-populacao-em-idade-ativa-e-maior-entre-mulheres 

A taxa de participação feminina no mercado de trabalho, entretanto, é de 51,1% para mulheres negras e de 53,6% para mulheres não negras, no primeiro trimestre de 2023. Isso significa que, em média, de cada dez mulheres em idade para trabalhar, apenas 5 participam do mercado (empregadas ou buscando um emprego). 

Fonte: https://ibre.fgv.br/blog-da-conjuntura-economica/artigos/crescimento-da-populacao-em-idade-ativa-e-maior-entre-mulheres 

Logo, o cenário apresenta o aumento da população em idade para trabalhar (e consequentemente, da população participante do mercado de trabalho) e, em contraponto, as maiores taxas de desemprego para mulheres negras e não negras, e menores rendimentos médios. Conforme artigo publicado com dados de 2021, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), “as mulheres negras recebem, em média, R$1.617, enquanto as mulheres não negras recebem em média R$2.674. A média salarial para os homens negros fica em torno de R$1.968, já para os homens não negros o valor fica em torno de R$3.471”. Dados que apontam a necessidade de posicionamento das empresas com estratégias de inclusão e diversidade. 

Outro recorte relevante, pensando justamente no desenvolvimento de tais estratégias, é sobre a participação do grupo LGBT+ no mercado de trabalho brasileiro. Em pesquisa conduzida pela SantoCaos (2022), constatou-se que:  

  • O tempo médio de empresa para pessoas LGBTI+ é 3 anos, frente a 4 anos de não LGBTI+, o que indica um crescimento recente desse grupo nas organizações. Mais da metade (54%) está há menos de 2 anos nas empresas (39% não LGBTI+). 
  • Não estão na liderança das empresas (16% frente a 26% dos não LBTI+) e ganham menos (47% têm renda inferior a 4 salários-mínimos, frente a 36% não LGBTI+).  
  • Pessoas LGBTI+ presenciaram e sofreram 10% mais situações de assédio e/ou discriminação que as pessoas não LGBTI+. 

A composição das empresas ainda não reflete a composição do perfil demográfico da população ativa brasileira. A transição a um mercado formal de trabalho inclusivo acontece na medida em que há transformação cultural, dependendo de mecanismos que assegurem a atração e a permanência de grupos diferentes. O ritmo é lento, mas existem ferramentas que podem catalisar a mudança enquanto estruturam requisitos de sociabilidade inclusiva e padrões éticos de comportamento.  

Assegurando a inclusão: por que Canais de Acolhimento funcionam? 

O funcionamento dos Canais de Acolhimento depende da implementação estratégica no contexto corporativo e dos recursos que tornam a operacionalização possível. 

Canais de Acolhimento funcionam ao promover um contato com a realidade social  

Antes de tudo, o Canal de Acolhimento funciona por responder a uma realidade social, enquanto ferramenta compatível ao ambiente organizacional das companhias. Assim, situações complexas são direcionadas a um tratamento adequado e eficaz, através de seu relato em um espaço de confiança.  Por exemplo, os dados de Canais de Acolhimento da Aliant mostram que, em canais específicos para mulheres, 70% dos relatos de alto impacto foram feitos renunciando ao anonimato.  

Relatos recebidos em um canal de acolhimento

Quando pensamos em cuidado com a saúde da mulher e ações de Outubro Rosa, é indispensável às empresas considerar que saúde é conceito multifatorial e que ter um espaço de acolhimento é um passo importante para atuar sobre uma realidade constrangedora: o local de trabalho é o segundo mais frequente onde assédios contra a mulher ocorrem. No último ano, dados internos da Aliant mostram aumento de 13% de denúncias de assédio moral e sexual, número que tende a aumentar quando consideramos pesquisas amplas – 76% das mulheres relatam já ter sofrido violência e assédio no trabalho. 

Em um cenário em que a composição dos quadros de funcionários está evoluindo para se tornar mais diversificada, esses canais auxiliam a capturar e compreender as experiências e preocupações de grupos minoritários dentro da organização. A gestão de pessoas passa a contar com um importante aliado para entender o estado do ambiente interno, bem como para ampliar a sua perspectiva sobre a realidade dos contratados.  

Como os dados publicados sobre o Canal da Mulher, do Magalu: no último ano, dos 170 casos de violência relatos, 59,6% aconteceram contra colaboradoras autodeclaradas pretas, amarelas e pardas, frente à 39,9% contra mulheres brancas. Na questão das tipologias, as respostas podiam ser múltiplas, concluindo que ameaças e violência psicológica são agressões mais sofridas pelas colaboradoras (respectivamente, 88,7% e 81,7%), mas são comumente acompanhadas por violência patrimonial (65,7%), violência física (51,2%) e violência sexual (48,4%).

Assim, acessando esse nível de informação, a empresa tem maior capacidade de estabelecer medidas que sejam efetivas para impactar a sua realidade. As situações de sexismo, racismo e LGBT-fobia precisam ser acompanhadas, mapeadas e estrategicamente combatidas, mas nada disso acontece se não forem comunicadas em canais apropriados e com detalhamento suficiente para a sua apuração. 

Assim, os Canais de Acolhimento estão alinhados com as políticas públicas e privadas de inclusão e permanência, refletindo o compromisso da organização com a promoção da igualdade e a eliminação da discriminação. Demonstra o comprometimento da empresa com a criação de um ambiente de trabalho que respeita e valoriza a diversidade, o que, por sua vez, pode atrair talentos diversos e aumentar a reputação da organização como um local inclusivo, que promove o cuidado. 

Canais de Acolhimento funcionam quando compõem políticas de cuidado  

Certamente, os Canais de Acolhimento não se limitam apenas a receber denúncias, mas também desempenham um papel importante compondo políticas de cuidado, as quais permitem que a empresa atue sobre questões socialmente relevantes. Por exemplo, na promoção de campanhas e iniciativas como o Outubro Rosa, proporcionam um espaço onde os colaboradores podem discutir essas questões, compartilhar informações e experiências pessoais, e até mesmo planejar e participar de atividades relacionadas à campanha. Canais podem ser operacionalizados como ferramentas de engajamento. 

Em relação às políticas de cuidado, ao demonstrar um compromisso ativo com causas socialmente relevantes, como a saúde das mulheres, a empresa cria um ambiente de trabalho onde elas sentem apoio em questões que vão além das operações comerciais. Isso pode melhorar o engajamento das funcionárias, fortalecer o senso de comunidade dentro da organização e reforçar o posicionamento da empresa como uma entidade socialmente responsável

Em resumo, os Canais de Acolhimento não só desempenham um papel fundamental na promoção da igualdade e na prevenção da discriminação, mas também podem ser alavancados como ferramentas para apoiar e participar ativamente das campanhas sobre questões sociais. 

Canais de Acolhimento funcionam ao se conectar a recursos operacionais específicos e viáveis 

O terceiro ponto da nossa análise sobre a efetividade dos Canais de Acolhimento se refere aos recursos operacionais que o fazem funcionar. A companhia que objetiva adotar um Canal deve estar atenta a 3 pontos principais:  

  • ele deve ser externo; 
  • ele deve permitir a confidencialidade das pessoas relatantes;  
  • ele deve estar inserido em um programa de integridade. 

Ser um Canal externo, ou seja, administrado por uma empresa especializada, com pessoal treinado e expertise específica, é uma abordagem que tem ganhado destaque nos últimos anos por diferentes motivos.  

Em primeiro lugar, a neutralidade e imparcialidade do processo de triagem e primeira análise do relato recebido. Mesmo que haja treinamento específico para os profissionais de um canal interno, a percepção sobre a imparcialidade do Canal não será a mesma. Denunciantes podem ter mais confiança de que suas preocupações serão tratadas de maneira justa, sem qualquer viés interno, com um Canal operado por uma empresa terceira. Também pode ser citado como benefício a redução de conflitos de interesses que poderiam surgir caso o canal fosse interno, especialmente em denúncias relacionadas a membros da alta administração ou outros funcionários dentro do fluxo de apuração. 

A percepção das pessoas relatantes também está envolvida com o segundo tópico, que é o aumento da confiança na ferramenta de report. Saber que a organização está disposta a investir em um Canal de Acolhimento externo demonstra um compromisso genuíno com a ética e a integridade. Isso pode aumentar a confiança dos funcionários na capacidade da empresa de lidar com questões éticas de maneira séria e responsável. 

Em terceiro lugar, uma empresa especializada possui a expertise necessária para lidar com relatórios de maneira eficaz. Isso inclui treinamento específico e recorrente da força de trabalho, a capacidade de avaliar adequadamente as denúncias, conduzir ligações de modo a aumentar a qualificação do relato e fornecer orientação apropriada para as partes envolvidas. 

De fato, a externalização de um Canal de Acolhimento para uma empresa especializada oferece várias vantagens, mas ressaltamos como mais importante a garantia da confidencialidade, caso seja a opção do relatante. Sem dúvidas, garantir o anonimato, especialmente para públicos que são minoria e questões sensíveis de integridade e estigma, é um elemento essencial para um Canal eficaz, pois reduz o medo de retaliação e represálias de colegas de trabalho ou supervisores. O anonimato proporciona segurança, permitindo que os denunciantes relatem sem temor de consequências negativas para sua carreira ou bem-estar.  

Aliado a esse fator, o anonimato encoraja um maior número de pessoas a denunciar questões éticas. Muitas vezes, os indivíduos que enfrentam discriminação ou assédio podem relutar em se identificar por medo de estigmatização. O anonimato elimina esse obstáculo, tornando mais provável que aqueles que enfrentam discriminação ou outros problemas éticos se manifestem.  

Somado a ser externo e permitir confidencialidade, há o terceiro ponto: a integração com um Programa de Integridade. A realidade é que um Canal, seja ele de Denúncias ou de Acolhimento, é incapaz de funcionar de modo isolado. 

Como implementar um Canal de Acolhimento no Programa de Integridade? 

Um programa de integridade pode ser descrito como um sistema de controle organizacional formal concebido para impedir comportamentos antiéticos, criar uma cultura ética e promover comportamentos éticos (KAPTEIN, 2009). Dentro das estruturas organizacionais empresariais modernas, um programa é a primeira linha de combate, mas também pode atuar como suporte às atividades de Direitos Humanos e Diversidade & Inclusão.  

Isso ocorre porque um dos objetivos de um programa de integridade (ou programa de ética) é o de influenciar positivamente o comportamento dos colaboradores, direcionando mensagens a eles por meio dos seus componentes. Um canal de acolhimento é uma das ferramentas que precisam ser implementados dentro de um programa de integridade por necessitarem, para a sua eficácia, da estrutura existente nesses.  

Como é a estrutura de um programa de integridade? 

Não existe um consenso sobre quais pilares compõem um programa de integridade, na realidade. O ponto de partida envolve as diretrizes da U.S. Federal Setencing Guidelines for Organizations (2008) e teóricos discutem a incidência de mais ou menos pilares. Para a nossa análise da composição e funcionamento dos pilares/componentes, utilizamos como base o estudo The Effectiveness of Ethics Programs: The Role of Scope, Composition, and Sequence (2015), construído pelo Professor de Ética Empresarial Muel Kaptein, que entrevistou mais de 5 mil profissionais para averiguar a eficácia de programas de ética. Kaptein (2009, 2015) defende que um programa de compliance eficaz pode ser composto por 8 componentes.  

Estrutura de um Programa de Integridade

O primeiro componente é o Código de Ética, que pode ser definido como “um documento distinto e formal que contém um conjunto de prescrições desenvolvidas por e para uma empresa para orientar o comportamento presente e futuro em múltiplas questões de, pelo menos, os seus gestores e empregados entre si, a empresa, as partes interessadas externas e/ou a sociedade em geral” (KAPTEIN; SCHWARTZ, 2008, p. 113).  

Um código de ética proporciona clareza ao definir o comportamento ético e distingui-lo do comportamento não ético. Ele atua como pedra fundamental do programa de integridade, incentivando o engajamento ao expressar valores e princípios com os quais os colaboradores podem se relacionar, se inspirar e motivarem-se a seguir. Igualmente importante, estimula discussões sobre questões éticas, fornecendo um quadro normativo que facilita a conversa e permite a identificação e denúncia de violações. 

O código não é o único documento apontado como essencial, no entanto. Devem existir políticas de responsabilidade para colaboradores em caso de comportamentos não éticos; políticas de investigação e correção, que lidem com alegações de comportamentos não éticos, também devem ser listadas e conhecidas dentro da estrutura; e devem existir políticas de incentivos e recompensas por comportamentos éticos. As motivações para essa estrutura formal são a transparência de quesitos para aplicação de normas, o direcionamento para os envolvidos na operação e a proposição de uma lógica para todo o programa. 

Políticas de gestão e responsabilização de colaboradores estabelecem as expectativas da empresa em relação ao comportamento ético dos funcionários e as consequências que podem resultar de desvios éticos. Assim, cria-se um ambiente transparente e previsível, no qual os funcionários podem tomar decisões informadas sobre seu comportamento. 

Já as políticas de investigação e correção são essenciais para lidar com alegações de comportamentos não éticos. Elas estabelecem procedimentos para relatar, investigar e remediar alegações de má conduta. Ter essas políticas em vigor garante que as preocupações éticas sejam tratadas de maneira adequada e consistente, promovendo a confiança dos funcionários no sistema de conformidade da organização. 

A existência de políticas de incentivos e recompensas por comportamentos éticos reforça uma cultura ética. Essas políticas reconhecem positivamente os funcionários que demonstram conduta desejável, incentivando a adesão a esses padrões, construindo uma cultura organizacional em que a ética seja valorizada e incentivada. 

🔗 Veja também: Como estruturar o setor de Compliance?

Além dessas estruturas documentais, deve existir um ponto focal para tomada de decisão envolvendo questões éticas. Ele pode ser uma pessoa (Compliancer Officer, por exemplo) ou um grupo de pessoas, como um Gabinete/Comitê de Ética. As funções de um comitê de ética, para Kaptein (2002, 2015) envolvem atuar como:  

  • Iniciador – força motriz e motivadora por detrás do desenvolvimento e implementação de um programa de ética;  
  • Coordenador – criando coerência entre as componentes de um programa de ética;  
  • Facilitador – responsável pela implementação e manutenção do programa de ética;  
  • Comunicador – elo entre os funcionários e a direção, entre os departamentos, entre as áreas funcionais e entre a organização e as partes interessadas externas;  
  • Conselheiro – fornecendo sugestões sobre a melhor forma de implementar as componentes, levantando questões éticas e oferecendo formação sobre como lidar com dilemas; e  
  • Mediador – ajudando a resolver conflitos éticos, podendo oferecer diretamente orientações para funcionários quando se depararem com questões e problemas. 

A formação ética, treinamentos, comunicações e engajamento compõem parte crucial da estrutura de um programa de conformidade. Treinamentos ajudam a esclarecer as documentações, fornecem orientações e aprimoram a capacidade dos colaboradores em reconhecer questões éticas em situações diárias. A formação em ética cria um ambiente propício para a identificação e discussão de dilemas éticos. Os trabalhadores podem compartilhar preocupações, aprender com as experiências uns dos outros e buscar orientação quando confrontados com questões complexas. Isso contribui para uma cultura de abertura e aprendizado na organização. 

Além das estruturas formais (Código e Políticas), operacionais (Comitê) e de engajamento (treinamento), também devem existir componentes que dizem respeito à avaliação da ética de uma organização. O Monitoramento e Auditoria desempenham funções cruciais dentro de um programa de integridade, contribuindo para a avaliação e aprimoramento contínuo da ética organizacional. Através da implementação desses sistemas, as organizações são capazes de realizar uma análise crítica e sistemática de seu desempenho ético e da eficácia de seu programa de integridade. 

O monitoramento interno, como parte desses componentes, engloba a observação constante e a análise de práticas e comportamentos éticos. Isso implica na coleta, análise e interpretação de dados relacionados à conformidade com políticas éticas, detecção de tendências preocupantes e identificação precoce de potenciais violações. O objetivo principal é identificar áreas de risco e garantir que as políticas e diretrizes éticas sejam respeitadas de forma consistente em todos os níveis organizacionais. 

Por sua vez, as auditorias éticas representam uma avaliação mais aprofundada e sistemática da conformidade com padrões éticos e regulatórios estabelecidos. Elas envolvem a revisão detalhada dos processos, políticas e práticas da organização, verificando o alinhamento com os princípios éticos, identificar áreas de não conformidade e sugerir melhorias. Essas auditorias, muitas vezes conduzidas por auditores internos ou externos independentes, visam fornecer uma visão imparcial e crítica do estado da ética organizacional. 

A função combinada de monitoramento e auditoria é essencial para garantir a eficácia do programa de integridade. Ao monitorar continuamente as operações e conduzir auditorias periódicas, as organizações conseguem identificar e abordar proativamente quaisquer desvios, mitigar riscos emergentes e melhorar suas práticas éticas. Além disso, esses componentes contribuem para a promoção de uma cultura organizacional ética, reforçando a importância do cumprimento de padrões e da integridade em todos os níveis da organização. No entanto, elas devem atuar conjuntamente com Canais de Denúncia (ou linhas éticas).  

A função primordial de uma linha de denúncia de ética reside na estimulação do diálogo e na criação de um ponto de acesso que possibilita a denúncia de comportamentos não éticos, em consonância com o objetivo destacado por Weaver et al. (1999). Em primeiro lugar, o canal de denúncias serve como um catalisador para a discussão de dilemas éticos dentro da organização. Ele fornece um meio pelo qual os funcionários podem expressar preocupações e debater questões éticas sem o temor de retaliação ou represálias. Isso, por sua vez, contribui para a promoção de uma cultura de abertura na organização, incentivando os denunciantes a compartilharem suas preocupações e perspectivas sobre questões éticas. 

A função do canal de acolhimento pode ser entendida como um mecanismo que promove a divulgação e o exame de questões éticas, contribuindo para uma cultura de integridade e transparência. Portanto, ele não apenas aumenta a consciência sobre questões éticas, mas também ajuda a prevenir e corrigir comportamentos não éticos, beneficiando a organização como um todo. 

Como Canais de Acolhimento compõem um Programa de Integridade? 

Embora não haja consenso sobre quais pilares devem, de modo exato, compor um programa de integridade, a literatura concorda que apenas os componentes isolados não são capazes de provocar uma mudança de comportamento eficaz. Estudos apontaram que a intenção ética dos colaboradores era significativamente mais elevada em relação à combinação de três componentes do que em relação aos componentes de modo isolado (RUIZ ET AL., 2014).  

Isoladamente, o Canal de Denúncias, incluindo ferramentas específicas como um Canal de Acolhimento, “não parece reduzir o comportamento antiético. Ele poderia funcionar como um canal de comunicação para um escritório de ética e vice-versa, o que foi sinalizado pelo efeito de interação significativo entrado entre um [comitê] de ética e uma linha de denúncia ética” (RUIZ ET AL., 2014:438). Entendido isso, para consolidar valores de inclusão e pró-acolhimento, bem como uma cultura antirracista, antimisoginia e antiLGBT+fobia, uma companhia precisa estruturar um programa de integridade que englobe diferentes pilares, considerando as três categorias (Códigos, Comitê e Fiscalização).  

O compliance acolhedor envolve a implementação de políticas e práticas que promovam a igualdade de oportunidades e a não-discriminação no local de trabalho. Por fim, algumas medidas que as empresas podem adotar incluem:  

  • Estabelecer políticas de diversidade e inclusão que sejam claras e abrangentes, englobando todas as áreas da empresa;  
  • Fornecer treinamento regular para gerentes e funcionários sobre a importância da diversidade e inclusão, incluindo treinamento sobre racismo, homofobia e outras formas de discriminação;  
  • Estabelecer medidas de ação afirmativa para garantir que grupos historicamente marginalizados, como mulheres, pessoas negras e LGBTQIA+, tenham oportunidades iguais de avançar na empresa;  
  • Estabelecer canais seguros, específicos e confidenciais para relatar discriminação, assédio, lgbt+fobia, e outras formas de comportamento inadequado;  
  • Realizar auditorias regulares para identificar práticas discriminatórias e tomar medidas para corrigi-las;  
  • Promover uma cultura de inclusão por meio de eventos e atividades que celebrem e valorizem a diversidade.  

Índice

Luara A. Stollmeier

Luara A. Stollmeier

Consultora e Pesquisadora da Aliant. Doutora pela UFMG, possui uma década de experiência em Pesquisa e Gestão de projetos, possui habilidades na coordenação de pesquisas, análise de dados e comunicação de temas complexos.

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